02 fevereiro, 2008

Dor - fantasma num país mutilado

«Kavaleka é a aldeia com maior concentração de mutilados por metro quadrado no mundo. A dor-fantasma acontece a quem sofreu uma amputação de um membro e continua a «sentir» dores ou comichões na perna, mão ou braço amputados.

Dois técnicos franceses foram apresentados por um elemento da UCAH a uma multidão de mutilados, no fim de uma sessão de esclarecimento sobre a desmobilização dos mais de dois mil amputados de Kavaleka. Os mutilados ouviram o jovem casal elaborar sobre aquilo que a maior parte deles sentia. Falaram francês, mas havia um tradutor fluente, saído de uma das escolas de línguas que a UNITA instalou nesta imporvável província.

Os mutilados viram então a máquina mágica: uma caixa que fornece corrente a electródos que, por sua vez, ligados às ramificações nervosas da parte amputada, neutralizam a dor-fantasma. Todos os interessados foram convidados a estar presentes na manhã seguinte, às 8h00, para receber os choques abençoados no coto. Uma fila enorme formar-se-ia muito antes dessa hora e a equipa francesa passou três dias a aplicar o tratamento e a ensinar a máquina.

Setecentos deficientes aplaudiram os terapeutas em ovação quando o aparelho foi exibido.

Júbilio num país mutilado: os fantasmas da dor desaparecerão; basta uma máquina, que vem de fora para ficar e só precisa de pilhas para funcionar.» p. 52 e 53

Nunca fui a África. Sobre África sei muito pouco. Sei o que vejo na televisão e o que leio nos jornais. Mas ao ler este excerto, procurei imaginar como será a vida em Kavaleka. Dor. Tristeza. Fome. Falta de esperança no futuro. Não consigo imaginar felicidade, alegria, vontade de crescer...

Em que é que acreditarão estes jovens mutilados? Será que conseguem esquecer os fantamas de um país onde tudo falta? Ou nem sequer isso lhe podemos pedir?

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